O STF e o desincentivo para realização de contratos de locação comerciais
É indiscutível que vivemos um momento de recessão. Hoje, abrir uma empresa e empreender no Brasil, realmente, é uma decisão corajosa e para poucos. A locação comercial, desta forma, é a única forma viável para muitos empreendedores botarem em prática o seu novo negócio e as suas ideias.
Desde a entrada em vigor da Lei n° 8.245, de 1991, a Lei n° 8.009, de 1990 passou a reconhecer, em uma das exceções da impenhorabilidade do bem de família, o caso do fiador, nos contratos de locação comerciais (art. 3º, inciso VII, da Lei n° n° 8.009, de 1990).
Desde então, em caso de cobrança de locativos, caso o locatário não tivesse bens para pagar, poderia a dívida recair sobre o bem de família do fiador.
Já em 2006, tal debate sobre a legalidade deste dispositivo legal chegou às portas do STF, em julgamento do Recurso Extraordinário n° 407.688/SP, em que, na época, o Ministro Cezar Peluso, justificou que, caso não garantisse ao proprietário a possibilidade de penhora do bem do fiador, certamente as locações ficariam mais caros, dificultando, justamente, o acesso do locatário à locação.
Em 2010, foi julgado Recurso Extraordinário paradigmático de n° 612.630, ocasião em que, enfrentando o tema nº 295 da repercussão geral, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu pela constitucionalidade da penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação. (Julgamento: 16.09.2010, Publicação: 23.09.2010).
Com base neste entendimento, em 2014, o STJ Recurso Especial n° 1363368/MS, culminando, posteriormente, na edição da Súmula 549, que dispõe o seguinte: “É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação”.
Acontece que, em acórdão publicado em 18 de fevereiro de 2019, a Primeira Turma do STF decidiu que, em se tratando de contrato de locação de imóvel comercial, deve ser protegido o bem de família do fiador que figura na avença locatícia (Recurso Extraordinário nº 605.709).
Mesmo assim, o TJ/SP, por exemplo, não tem aplicado o recente entendimento do STF, sob fundamento de que não haveria efeito vinculante por parte do Recurso Extraordinário nº 605.709.
É certo que, diante deste novo entendimento do STF, pode-se aumentar os custos das locações comerciais (custos de transação). Por exemplo, a partir de agora, com a possiblidade do locador, em caso de inadimplência do locatário, não poder atingir o bem de família do fiador, serão necessárias novas garantias que, provavelmente, serão mais custosas para o locatário.
Ou seja, no momento em que a insegurança de receber os aluguéis aumenta para o locador, consequentemente, as exigências e garantias tendem a aumentar. Desta forma, os contratos de locações comerciais tendem a se tornarem mais complexos e mais onerosos. Em decorrência disto, o número de locações comerciais tende, até mesmo, a diminuir.
Portanto, no momento em que o STF muda o entendimento que havia sendo aplicado, consequentemente (e muito provavelmente desconsiderando os efeitos econômicos da decisão) prejudica a própria realização dos contratos de locação comerciais.
Em um momento de crise, mais uma dificuldade imposta pelo Poder Judiciário, neste caso pelo STF, ao empreendedor.
Demétrio Giannakos
Membro da Divisão Jurídica da FEDERASUL